Com o trabalho escasseando cada vez mais, a vida foi ficando difícil. O parco salário de minha aposentadoria como professor da UFF não dava mais para nos manter com dignidade, mesmo em Visconde de Mauá, onde se consegue suprir com um mínimo as necessidades de sobrevivência. Eram cada vez mais raras as solicitações de trabalho que eu recebia. Aí me lembrei de explorar uma de minhas possibilidades de trabalho que estava adormecida há décadas, a de tradutor. Afinal eu tinha estudado a língua de nossos irmãos do norte na Cultura Inglesa por alguns anos, no Centro Cultural Brasil Estados-Unidos outros tantos anos, além de ter (quando adolescente no tempo em que, logo depois da guerra, os americanos estavam dando a volta ao mundo em seus poderosos navios de guerra fazendo o que chamavam de política de boa vizinhança) ido algumas vezes à praça Mauá no Rio de Janeiro, reunido uma meia dúzia de marinheiros americanos com aquelas calças boca-de-sino, e os levava para o pão-de-açucar, o corcovado, e para comprar "brazilian gems" na H. Stern - a atendente já me conhecia e até me deu uma vez uma água marinha à título de comissão - e para os puteiros do mangue. Eu ganhava alguns caraminguás, mas na verdade ganhava o traquejo do falar inglês, evidentemente que era o inglês de marinheiros, mas mesmo assim foi muito útil mais tarde. Ainda adolescente eu ia ao cinema e afundava na cadeira de tal modo que o assento da cadeira da frente obstruísse a visão das legendas, de modo que eu ficasse apenas escutando o que era dito pelos artistas. As letras das músicas cantadas por grandes cantores de ótima dicção como Nat King Kole, Frank Sinatra, Tony Bennett e outros, tudo isso junto acabou sendo muito valioso quando anos depois fui, com minha mulher e filhas, morar em Chicago durante a bolsa de estudos que ganhei para o curso de mestrado no Institute of Design. Ora, pensei, se quando eu era ainda um garoto - e meu conhecimento de inglês era muito menor do que é hoje - e o meu irmão Sergio, que havia recém entrado para a carreira diplomática, me arranjou um 'bico' para traduzir muitas publicações do Itamarati que se chamavam 'Guias de Informações sobre Postos' e destinavam-se a orientar os diplomatas que eram mandados para as embaixadas brasileiras pelo mundo, porque não usar meu conhecimento da língua bretã, agora aumentado, e procurar uma nova atividade para melhorar o "caixa"? Dito e feito. Fui para a Vila de Visconde de Mauá, em frente ao posto do correio, que era o único lugar onde o celular pegava e liguei para meu velho amigo e editor Jorge Sávio. Sua editora não trabalhava com títulos estrangeiros, mas ele me disse: "anota aí um endereço que vou lhe dar" e passou-me um endereço eletrônico do dramaturgo americano Lance Sherman Belville que tínha morado no Brasil no tempo da ditadura trabalhando como correspondente para cadeias americanas de jornais e que desejava que uma de sua peças fosse traduzida para o português pois ele queria montá-la no Brasil, para onde viria em breve. Devemos a nosso querido amigo Jorge Nogueira Sávio a mudança radical em nossas vidas!
domingo, 30 de dezembro de 2007
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